Entrevista Leocadia Dias
Sobre Adriano Correia de Oliveira
Cantor e poeta
18 e 20 de abril 2025 na Radio alma
Apresentaçao da Leocadia Dias

Pequena biografia do Andriano Correia de Oliveira pela Leocadia Dias
Adriano, Filho de Joaquim Gomes de Oliveira (conhecido por Trafugueiro) e de Laura Correia, nasceu no Porto a 9 de Abril de 1942, na Rua Formosa, tinha 3 meses de idade quando os pais se mudaram para a Quinta de Porcas em Avintes, concelho de Vila Nova de Gaia. O Adriano não era filho único, tinha e tem uma irmã mais velha: a Filomena, que era professora do ensino primário. Que estranhamente não é mencionada na Wikipédia, nem em parte nenhuma. Como expliquei logo no início e é esta a minha opinião a internet não é, nem nunca será uma ciência exacta, principalmente a Wikipédia à qual qualquer pessoa tem acesso e pode escrever o bem que bem entende.
Hoje mais que nunca, os seus donos são o seu espelho: Trumps, Gates, Musks, Zuckerbergs, com as suas redes associais e tutti quanti, são os seres menos fiáveis que existem à superficie da terra, estando em total contradição com os valores que o Adriano defendeu e nos deixou como herança. Ele utilizou as palavras como arma, contra a servidão, a mentira e a injustiça!… A wikipédia descreve-o como se fosse um caso único em Avintes, por ter crescido e ter sido educado no seio duma família “profundamente” católica”, até aí nada de extraordinário, no contexto de um regime fascista conivente com a igreja. Toda a população era profundamente católica, mesmo contra a sua vontade (…). Ai de quem não fosse à missa em Avintes. O padre “Quim” recusava até, casar quem não fosse um fiel assíduo. “A infância de Adriano Correia de Oliveira foi ritmada pelo ambiente que descreveria mais tarde como «marcadamente rural, entre videiras, cães domésticos e belas alamedas arborizadas com vista para o rio [Douro]».
O rio Douro era parte integrante da vida do Adriano, principalmente quando os filhos nasceram. Ele tinha um pequeno barco, que se chamava Viking que os filhos adoravam e no qual muito se divertíram. Naquela época havia um costume bem avintense: que eram os passeios do domingo, rio acima, rio abaixo, eram uma tradição domingueira, sanjoanina, traversia ou passagem para a outra margem e até de férias. Tradição que ainda conheci e pratiquei até aos anos 80, data na qual vim viver para França: subir o rio com a cesta da merenda (com todo o tipo de petiscos, boa pinga, broa, bolo e velhotes…) uma viola, uma guitarra ou as duas, atracar em pequenas praias forjadas pela natureza passar as tardes a petiscar, a rir, dormir, conversar, mas acima de tudo a cantar.
Existe um vídeo no youtube com uma única imagem por ilustração: uma foto do Adriano no seu barco Viking imortalizado subindo o rio Douro: a canção popular açoreana “Lira”.
Concluiu os estudos secundários, no Liceu Alexandre Herculano, no Porto, em 1959 ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. E foi lá que o Adriano, utilizou as palavras e as cantigas como balas contra o regime, foi lá que o Adriano de hoje se forjou. Residia na Real República Ras-Teparta,(raios te partam, suponho, (…) jogo de palavras que o regime, não podia censurar) foi solista no Orfeão Académico, membro do Grupo Universitário de Danças e Cantares, actor no CITAC, guitarrista no Conjunto Ligeiro da Tuna Académica de Avintes que fundou com o seu grande amigo: o Padre Araújo, missionário (outra grande figura de Avintes que como ele partiu cedo demais) aos 41 anos de idade) jogou voleibol na Briosa, a lista é interminável.
Casa com Maria Matilde Lemos de Figueiredo Leite, em 1966. Desta união nascem dois filhos: Isabel e José Manuel nascidos em 1967 e 1971 respectivamente . Mais tarde divorciaram. Adriano, começou a cantar no Porto, no liceu onde estudava. Um dia uma tia ofereceu-lhe uma guitarra, começou a tocar nas festas, nas récitas de finalistas do liceu Alexandre Herculano, que se faziam geralmente no Teatro S. João. Mudou-se para Coimbra, mas uma vez lá, continuou a tocar guitarra e a cantar Fado de Coimbra, foi lá que “começou a “gargarejar” como ele dizia, quando cantava serenatas da rua para o 4º andar com “voz de ovo estrelado” (formúla que o Zeca utilizava) e foi assim que tudo começou!… Grava o seu primeiro disco, um disco de Fados de Coimbra.
O Adriano era um cantor sem medo, mudou completamente a forma de o cantar, com letras que desafiávam o poder do Estado Novo. Desempoeirou a música portuguesa da época, tornando-a numa arma à sua maneira, basta ouvir o tema “As balas” para perceber a sua audácia contra o regime do medo. O Adriano foi o primeiro a cantar poemas contra a guerra colonial e contra a PIDE-DGS (polícia política de Salazar). Aos olhos de Manuel Alegre, cito “ele foi o mais corajoso de todos os trovadores daquele tempo”, “porque naquele contexto e no tempo em que ele começou a cantar e gravou esses discos, não foi só num período muito duro de repressão, foi também no início da Guerra colonial” era preciso uma coragem desmedida. “Dizer palavras proíbidas e perigosas naquele tempo, era como lançar bombas”.
Cantou trovas e cantigas, sem jamais ter deixado de cantar fado. Para ele, cantar, não era um modo de vida, mas sim a sua vida, o Adriano era música, o que explica a sua extrema sensibilidade. Não dizia não a ninguém, quantas vezes veio aqui cantar a pedido de emigrantes e associações, até à data, em quasi 40 anos de presença em França, nunca tive conhecimento que uma qualquer homenagem digna desse nome, lhe tenha sido prestada. Isto não passa de um desabafo meu. Aproveito esta oportunidade, para homenagear a memória do jornalista Daniel Ribeiro, correspondente do Jornal Expresso e da RDPI em Paris, também foi diretor da conhecida Rádio Alfa, na qual tinha um programa quotidiano.
Num dia 9 de Abril, muito timidamente, telefonei para essa Rádio, queria pedir-lhe pedir um favor ao qual ele acedeu imediatamente. Recordo: Leocádia: Olá Daniel, sou uma fiel ouvinte do seu programa e hoje muito especialmente, gostaria de lhe pedir um imenso favor. Daniel: ( brincalhão), respondeu; “diga, diga”(…) Leocádia: hoje é o dia de aniversário do nascimento do Adriano, não se importa de passar uma cantiga dele, para marcar esta data? De imediato, a resposta fez-se pelas ondas, assim que ouvi o dedilhar da introdução pelas guitarras, da Trova do Vento que passa. Canção que se tornou num hino à Liberdade!… Graças ao Daniel nasceu ali uma singela, mas pura, tradição anual para recordar Adriano. Enquanto o Daniel lá esteve, no mínimo, a cada aniversário de nascimento e de partida, o Daniel dizia presente. Nunca deixando de telefonar, com o receio que se esquecesse… Daniel: “Acha, acha que me ía esquecer?” Descanse em paz Daniel!…
O Senhor Antero Santos do Lugar de Espinhaço em Avintes (perto da quinta de Porcas) é minha testemunha, pois sempre o avisava e pedia que dissesse a toda a gente, colocava o som no máximo e encostava o auscultador ao telefone, para ele ouvir. Quando eu era pequenina, para o poder ver ou estar com ele, o ideal era ao domingo, quando ele ía assistir aos jogos do F.C. Avintes, a malta aglutinava-se à volta dele, para mim, era impossível vê-lo e até tocar-lhe no meio daquela multidão. O meu pai sentava-me aos seus ombros para eu o poder ver, as pessoas ficavam loucas de alegria com sua a presença, já ele era casado e vivia fora de Avintes.
Assisti a tertúlias, em casa de amigos, passei momentos inesquecíveis que decerto ficarão nos meus e nos pergaminhos de muitos avintenses. Cantava onde chamassem por ele, sem jamais esperar por nada em troca. Era esse o Adriano!
Em homenagem, ao seu grande Amigo que morreu na Guerra colonial, deu o seu nome ao seu filho. A “Canção com Lágrimas” descreve bem a dor dessa perda (Manuel Alegre confirma e o próprio filho também). Esta canção nasceu de um poema que o Manuel Alegre escreveu para ele e a música é do Adriano. Isto para quem afirma que o Adriano nunca compôs.
Nos últimos anos da sua vida, o Adriano sofreu traições da parte de gente a quem tudo deu e que considerava como seus grandes amigos e camaradas de luta.
A golpada que lhe fizeram pseudo amigos na associação “CANTARABRIL Uma cooperativa de artistas de que foi impulsionador: estes mesmos “amigos”, (com) aspas, afastaram-no por uma razão mesquinha, pequenina à altura do gesto dos próprios, todos eles ligados à política. De todos os que o afastaram, os únicos que se levantaram contra, foram: Carlos Paredes, Luís Cília e Carlos do Carmo. Palavras de Adriano nessa época: “a Cantarabril tornou-se num lugar onde reina o mais descarado nepotismo e a mais ampla leviandade cultural”. Roubei este testemunho a Viriato Teles, um Amigo verdadeiro e jornalista de profissão), esta história é do domínio público e a forma como terminou também.
Foi uma ferida que nunca cicatrizou e eu sei que há quem nunca esquecerá essa golpada e que a considera como um acto criminoso. “Adriano passou para a “ERA NOVA”, onde estavam José Afonso e alguns dos seus amigos de sempre….” Viriato Teles “O Adriano era um homem de convicções e acima de tudo Leal.” (Viriato Teles)
Hoje a sua obra é considerada de interesse nacional, uma petição circulou e recolheu votos suficientes para que fosse discutida. Foi votada pelo parlamento, em Dezembro de 2024.
https://expresso.pt/blitz/2024-12-16-aprovadas-resolucoes-para classificacao-da-musica-de-adriano-correia-de-oliveira-como-de interesse-nacional-34c7ecda
Demorou, mas so é justica, no mínimo pelos filhos. No que me toca se os políticos fossem justos, essa petição nem nunca deveria ter sido necessária!…Politiquisses à parte, hoje cabe-me, cabe-nos a todos fazer com que a defesa da sua memória, valores e princípios intemporais, perdure e que essa chama se mantenha viva. Nada é adequirido, não há nada mais frágil que a Democracia, que neste momento sofre assaltos nos 4 cantos do mundo. Cantemos e evoquemos a herança que o Adriano Correia de Oliveira nos deixou, para fazer barragem a esses assaltos!…
“Era Outubro e chovia”: Recordo como o céu ficou negro, Avintes e a sua gente ficaram negras de tristeza e a Freguesia negra de gente!
França, 09 de Abril de 2025
Leocádia Dias
Foi essa a homenagem que a Leocadia Dias prestou para homenagear o Adriano Correia de Oliveira, recordando o dia do aniversario do seu nascimento.
Gravaçao da entrevista da Leocadia Dias sobre Adriano Correia de Oliveira